A Nefropatia por Ácido Aristolóquico começou por ser conhecida como Nefropatia de Ervas Chinesas. Este nome derivou dos primeiros casos conhecidos na Bélgica em que se reduziu a causa a suplementos de ervas chinesas para emagrecer.
Estudos subsequentes permitiram averiguar que não eram todas as ervas mas somente algumas muito ricas em ácido aristolóquico.
Apesar de alguma disputa por parte de muitos especialistas de medicina chinesa as provas a demonstrar fenómenos de causalidade que permitam justificar o nome Nefropatia por Ácido Aristolóquico são muito elevadas.
A justificação Belga para definir este fenómeno de causalidade fundamentava-se em 4 pontos:
1 – A maioria dos pacientes eram do sexo feminino (um caso masculino conhecido) e todos tinham como ponto comum o consumo da fórmula anti-emagrecimento com a droga Fangchi;
2 – Não existiam mais nenhums fatores causais possíveis de relacionar estes factos
3 – as pacientes pertenciam a um grupo de baixa prevalência de doença maligna renal que não consegue explicar a alta prevalência observada nestas mulheres;
4 – Uma associação temporal muito forte entre os tratamentos anti-emagrecimento que as pacientes efetuaram e o aparecimento de doença renal maligna. (9), (10)
Estudos epidemiológicos e clinicos
TABELA DE CONTEÚDOS
Estudos em Taiwan, que tem taxas de cancro do trato urinário 4 vezes superior ao dos países ocidentais sugerindo causa ambiental(11), comprovaram que o consumo de plantas contendo ácido aristolóquico estão associadas a maior probabilidade de desenvolver cancro no trato urinário. (4)
Apesar de algumas limitações face ao tipo de estudo e não inclusão de todas as variáveis (historial tabágico por exemplo) o estudo parece estar em linha com uma série de informações que associam ácido aristolóquico com cancro do trato urinário. (4)
Este estudo era relevante ao consumo de Mu Tong (Caulis Aristolochiae Manshuriensis) uma das plantas conhecidas com maior quantidade de ácido aristolóquico. (4)
Noutro estudo parecido, também efetuado em Taiwan, foram encontradas associações entre o consumo de mu tong e fanchi (2 formas com mais ácido aristolóquico) e aumento de risco de falência renal. (8)
Outros estudos na China também apresentam esta relação entre consumo de Mu Tong e cancro do trato urinário (5)
A Ásia e os Balcâs são as 2 regiões do mundo com maior incidência de Nefropatia por Ácido Aristolóquico. Os vários países asiáticos estão associados ao consumo de Mu Tong com origens nas 2 espécies mais ricos neste tipo de ácido. Nos Balcâs descobriu-se que a farinha de trigo vinha contaminada com grandes doses de Aristolochia clematitis o que pode ser a causa (9).
No entanto tem sido apresentadas algumas dúvidas epidemiológicas face à ligação causal entre Ácido Aristolóquico e os tumores renais nos Balcâs (12)
Fonte: By ArnoldPlaton – Own work, based on FIGURE 1 Topographical distribution of Balkan endemic nephropathy geographical foci from the article Balkan endemic nephropathy and associated urothelial cancer – Vladisav Stefanovic and Zoran Radovanovic, Nature Clinical Practice Urology (2008) 5, 105-112 doi:10.1038/ncpuro1019This vector imageincludes elements that have been taken or adapted from this: Estonia in Europe.svg (by TUBS)., CC BY-SA 3.0, Link
Apesar de não se conhecer a incidência total de nefropatia por Ácido Aristolóquico é possível asssociar a sua prevalência com locais (9) onde as farmacopeias tradicionais são mais importantes (e onde o consumo das 2 plantas mais ricas neste ácido é muito comum):
Com excepção da Bélgica onde se detetou os efeitos do tratamento com Fangchi é notório que existem muitos poucos casos.
Mas na China e Taiwan onde o consumo de plantas medicinais mais ricas em ácido aristolóquico é mais comum, existe uma clara prevalência de problemas renais.
Apesar de serem dados com algumas falhas (porque não se consegue saber qual a total extensão do problema) é certo que onde a Medicina Chinesa tem mais impacto cultural (China e Taiwan) são também as regiões mais afetadas pelo problema.
Nefropatia por Ácido Aristolóquico: estudos in vivo e in vitro
Foram encontrados links causais histológicos entre o Ácido Aristolóquico e o desenvolvimento de tumores renais malignos. Estes achados em tecidos humanos foram depois confirmados em modelos murinos. (9)
Tanto a forma química 1 e 2 de ácido aristolóquico desenvolveram vários tipos de adenomas renais e carcinomas pulmonares (10).
Vários tipos de administração (oral, intraperitoneal, etc…) todos estavam ligados à formação de neoplasias diversas que também afetavam o trato urinário.
Altas doses administradas oralmente ou intravenosa provocaram necrose severa dos tubulos renais, atrofia do baço entre outros efeitos.(10)
Estudos in vitro mostraram as alterações genómicas e celulares provocadas por ácido aristolóquico. Estas alterações foram observadas tanto em modelos murinos em estudos com Ácido Aristolóquico e autópsias de tecidos humanos de doentes expostos a este ácido. (10)
Juntando todos os dados
Existem sempre alguns problemas com os diferentes tipos de estudo. Uns são retrospetivos, outros não conseguem analisar todas as variáveis, etc…
No entanto quando se juntam todos os dados a imagem geral segue uma direção muito especifica: existem estudos a mostrar links causais muito fortes, estudos epidemiológicos parecem suportar essas conclusões assim como estudos in vivo.
Estudos in vitro conseguiram explicar os mecanismos celulares que provocam a Nefropatia por Ácido Aristolóquico tendo sido observados em modelos animais e em autópsias de seres humanos.
Surgem, então, várias questões e problemas que se colocam a especialistas de medicina chinesa.
Na China, onde a medicina chinesa tem um grande peso cultural, aliado ao tipo de sistema social, estes problemas podem passar despercebidos e apagados temporariamente para má sorte de muitos doentes. Mas no Ocidente é diferente.
Muitos céticos criticam profissionais de Medicina Chinesa por promoverem campanhas de marketing que todos os produtos naturais são seguros quando não é verdade (11).
Ácido Aristolóquico na Medicina Chinesa
Ácido aristolóquico encontra-se presente numa grande variedade de plantas por todo o mundo. Está presente em muitas plantas conhecidas como aristolóquicas e em algumas plantas conhecidas como Asarum. (2)
Plantas contendo ácido Aristolóquico são usadas na farmacopeia tradicional chinesa. Das várias plantas estudadas conhecem-se 7 que apresentam ácido aristolóquico: destas 7 só 2 apresentam quantidades relevantes e costumam ser proibidas no Ocidente (Radix Aristolochiae Fangchi e Caulis Aristolochiae Manshuriensis).
As outras 5 contêm quantidades muito reduzidas sendo 4 delas pouco usadas (Herba Aristolochiae Mollissimae, Radix Aristolochiae, Herba Aristolochiae, Fructus Aristolochiae) e uma delas usada com mais frequência (herba asari). (1)
De notar que, nas farmacopeias tradicionais não vem mencionado nenhum risco deste tipo associado à planta conhecida como Mu Tong. Isto deve-se provavelmente ao facto de terem sido usadas plantas de outras espécies para designar Mu Tong.
O estudo da farmacopeia tradicional mostrou que até ao século XVII as plantas originais, para se fazer Mu Tong, eram espécies akebias e até aos século XX foram usadas várias espécies clematis. Só a partir dos anos 50 se começou a usar a manshuriensis como base para Mu Tong (5).
Nesta tabela (6) é possível observar todas as fontes botânicas e geográficas de Mu Tong. Neste estudo foi possível diferenciar geneticamente as diferentes espécies (7) que contribuem para a droga Mu Tong.
Por outro lado a confusão dos nomes pin yin das drogas e plantas usadas faz com que se comercialize uma espécie quando se pretendia outra como ficou bem documentado no caso belga e na confusão dos nomes de fanchi entre 2 drogas que pertencem ao mesmo sistema de classificação na medicina chinesa (10) – o ingrediente S. Tetranda foi substituído pelo ingrediente Fangchi na fórmula anti-emagrecimento “Fang ji”.
Links para estudar melhor a Nefropatia por Ácido Aristolóquico
(1) https://www.decodedscience.org/aristolochic-acid-its-history-and-use-in-chinese-herbal-medicines/35466
(2) https://www.cancer.gov/about-cancer/causes-prevention/risk/substances/aristolochic-acids
(3) https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2815723/
(4) https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2815723/
(5) https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12503251
(6) https://journals.plos.org/plosone/article/figures?id=10.1371/journal.pone.0131185
(7) https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0131185
(8) https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0272638609015625
(9) https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0085253815532791
(10) https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK304331/
(11) https://sciencebasedmedicine.org/herbal-medicine-and-aristolochic-acid-nephropathy/
(12) https://jcbmr.com/index.php/jcbmr/article/view/14/34