Mitos da acupuntura e da Medicina Chinesa
TABELA DE CONTEÚDOS
Pode-se dizer que um mito social é algo ficcionado sobre determinados hábitos sociais.
Alguém duvida que os espinafres não tenham ferro? Ninguém. Até aparece no Popey.
Aqui temos um exemplo de um mito social, pois os espinafres não têm ferro nenhum.
E quando abriram uma garrafa de Champanhe de certeza que lá colocaram uma colher para o Champanhe não perder o gás.
No entanto, o único estudo feito, em França, mostrou que não existiam diferenças de gás nas garrafas de Champanhe onde tinham sido colocadas colheres ou facas e aquelas onde não fora colocado nenhum objecto.
Mas sabe o que vai acontecer no próximo Natal quando abrir o Champanhe? Exactamente. Vai colocar um garfo no gargalo da garrafa para esta não perder gás.
A função social dos mitos da acupuntura
Existem inúmeros mitos da acupuntura e existem mitos para alimentar todo o tipo de crenças. Essa é a sua função!
A relação dos médicos com estas técnicas e a forma como usam esses mitos para criar crenças na população é um exemplo perfeito.
Se por um lado a Ordem dos médicos propaga o mito que a acupuntura “não faz mal mas também não faz bem, não faz nada!” por outro lado o colégio de médicos acupuntores da mesma ordem divulga o mito que a “acupuntura só deve ser feita por médicos”.
A forma como campos ideológicos opostos usam estes mitos é outro exemplo.
Acima falámos do mito que a Ordem dos Médicos usava referindo que “não fazia bem mas também não fazia mal”. Este mito surge em oposição a outro mito criado pelos defensores destas terapias que como “são naturais, não tem efeitos secundários, logo só fazem bem”.
Estas 2 posições estão claramente erradas mas são mitos que estes grupos arranjam para se definirem enquanto grupos.
E esta definição de grupo e de identidade profissional é a razão pela qual os fisioterapeutas vão sempre considerar a fisioterapia invasiva como algo novo e revolucionário e nunca como acupuntura.
Criados para desvalorizar a profissão
Só funciona se você acreditar nela
Vamos deixar um ponto claro. A crença da pessoa influencia o tratamento e disso não há dúvidas.
Certamente que não é um efeito único na acupunctura pois os pacientes com cancro e crenças mais positivas quanto à sua cura respondem melhor aos tratamentos.
A crença é muito relevante para os resultados mas os efeitos clínicos da acupuntura nãos e explicam somente na crença.
É incompatível com outros tratamentos médicos
Mais um dos mitos da acupuntura pois esta terapia pode ser usada para potencializar outros tratamentos médicos na realidade.
Hoje em dia são imensos os médicos, enfermeiros e fisioterapeutas que aprendem acupunctura para aumentarem a eficácia dos seus tratamentos.
Um exemplo encontra-se nas alterações sentidas aos medicamentos SOS por pacientes com enxaqueca quando começam a fazer acupunctura.
Medicamentos que no passado já não obtinham efeito começam novamente a ter uma maior capacidade de intervir junto dos momentos de crise.
Provoca dependência
Não, este é um tratamento seguro e não há relatos de alguma vez ter provocado dependência em pacientes.
Sem dúvida que ocasionalmente, alguns céticos procuram usar este argumento.
No entanto, não tem qualquer lógica. Não existe nenhum mecanismo conhecido ou estudo que indique que esta terapêutica provoca dependência nos pacientes.
É vudu
Não é verdade pois o vudu é muito mais eficaz.
Brincadeiras à parte, acupuntura não é vudu e não tem efeito em bonecas de brincar.
Também não é obra do diabo e não está proibida na Bíblia.
Esta prática consiste na inserção de agulhas (definição muito limitativa mas útil neste contexto) em zonas específicas do corpo com o intuito de obter um determinado conjunto de efeitos fisiológicos locais e distais à inserção da agulha.
Só trata dor muscular
A dor é sem dúvida a principal indicação clinica da acupuntura.
Outros sintomas ou doenças como depressão leve, ansiedade ou insónia, bexiga neurogênica ou Síndrome do Intestino irritável também respondem à acupuntura.
“Não faz mal, mas também não faz bem”
Este mito da acupuntura e medicina tradicional chinesa surge em oposição ao mito oposto, exposto nas linhas abaixo.
Regra geral, muito usado pela Ordem dos Médicos e por céticos indica que são tratamentos inócuos sem qualquer tipo de benefício clínico.
No entanto este mito só se aplica aos acupuntores não médicos pois para os médicos acupuntores, esta terapêutica já tem validade.
A acupuntura é muito perigosa
Em 2012 o Daily Mail publicou um artigo intitulado “Hidden perils of acupuncture: Lost needles, punctured lungs and fainting among NHS horror stories“.
Este tipo de artigos ajudam a difundir os mitos da acupuntura como uma terapêutica perigosa, mas na realidade os estudos científicos mostram que é das terapêuticas mais seguras que existe.
O corno do rinoceronte trata disfunção sexual
Este é o mito social favorito dos céticos no ocidente e também já tem barbas. É usado para mostrar que esta prática é a principal responsável pela perseguição e extinção dos rinocerontes.
A origem deste mito está associado a uma ideia errada, tipicamente ocidental, que consiste em considerar como medicina chinesa tudo aquilo que os chineses gostam.
Se, em algumas partes da China, os chineses acreditam que o corno de rinoceronte trata disfunção sexual, então é medicina chinesa.
Na realidade, pela Medicina tradicional chinesa o corno de rinoceronte seria contra-indicado para disfunção sexual.
Esta droga está aconselhada no tratamento de quadros febris pediátricos com convulsões e nunca foi aconselhada no tratamento da disfunção sexual.
Mitos da acupuntura criados para vender consultas
Se for bem feita não dói
Sendo estes um dos mitos mais propagandeados pelos acupunturistas a verdade é que pode doer.
O desconforto ou sensação de dor neste tipo de terapêuticas está dependente de vários fatores como a sensibilidade do doente, capacidade do terapeuta comunicar com o paciente, dos objetivos e do local da puntura da agulha, etc….
Por exemplo, a puntura de um ponto localizado num nervo (neuromodelação periférica) vai desencadear reações que podem ser consideradas mais desconfortáveis.
Certamente o tratamento de pontos gatilho pode ser um pouco doloroso e tratamentos mais atuais para tendentes implicam claramente a presença de dor ou estímulos mais desconfortáveis.
Obviamente que a acupunctura bem feita não provoca feridas e não é tão desconfortável quanto possa parecer à primeira vista.
“Se não fizer bem também não faz mal”
Um dos mitos da acupuntura e da medicina chinesa mais propagado pelos acupuntores nos últimos anos.
No entanto é completamente falso.
1 – existem riscos físicos associados à prática da acupuntura. Apesar e serem raros existem.
2 – existem riscos de interações farmacocinéticas e farmacodinâmicas entre fitoterápicos e medicação;
3 – os fitoquímicos e as fórmulas da farmacopeia tradicional chinesa tem contra-indicações e efeitos secundários associados;
4 – existem riscos associados a má prática por parte do profissional: diagnósticos errados, terapêuticas inadequadas; etc…
Só pode ser feita por médicos
Sem dúvida, um dos mitos da acupuntura criado por uma classe que pretende dominar o mercado.
Não, a acupuntura não tem de ser feita por médicos.
Pode ser feita por qualquer profissional com formação adequada para a fazer, seja ou não seja médico.
Fisioterapia invasiva não tem nada a ver com acupuntura
Esta é a versão fisioterapêutica da acupuntura médica. A necessidade de criar este mito está nasce da necessidade de se manter uma dada identidade profissional ao mesmo tempo que se usurpam funções de outras profissões.
A fisioterapia invasiva usa agulhas de acupuntura e recorre a técnicas de acupuntura moderna e tradicional. Tal e qual como a acupuntura médica.
Acupuntura é importante para deixar de fumar
Um slogan importante e que dá dinheiro a muitas clinicas.
No entanto a acupuntura não se tem mostrado eficaz no tratamento da dependência do tabaco.
Já repararam que os tratamentos de acupuntura para deixar de fumar são sempre (ou quase!) mais caros que tratamentos para outro problema?
O segredo está na triagem dos pacientes através da venda de consultas mais caras e não num qualquer efeito da acupuntura para ajudar a deixar e fumar.
Relacionados com as crenças dos acupuntores
A medicina natural é amiga do ambiente
Sendo esta uma forma de medicina tradicional, mais associada às crenças de ligação do homem e da natureza é também considerada como mais amiga do ambiente.
Na realidade, muitas práticas da medicina tradicional chinesa são muito nefastas para a natureza.
1 – colocam espécies vegetais e animais em risco de extinção;
2 – provocam sofrimento animal desnecessário: remoção de bílis aos ursos por exemplo.
O meridiano de um doente fica afetado se for retirado o órgão correspondente
Infelizmente parece que existem muitas escolas que gostam de propagar este tipo de mitos.
Um meridiano (vaso longitudinal) é uma construção social, uma forma de classificar pontos com indicações clinicas semelhantes.
Ele tem o nome de órgão mas isso não significa que seja a mesma coisa.
De lembrar que o conceito de órgão em medicina chinesa engloba (ou não!) uma estrutura física (coração, vesícula, etc…) e um meridiano aos quais estão associados sintomas físicos e psicológicos.
Há vários factos que são importantes referir para acabar com estas dúvidas:
1 – existem órgãos na anatomia humana que nem sequer são referidos como órgãos em medicina chinesa, como a pele por exemplo.
Supostamente se existe esta relação entre órgãos e meridianos deveria existir o meridiano da pele.
2 – existem meridianos em medicina chinesa sem órgãos como é o caso do Fígado ou do pericárdio. O fígado é uma glândula e o pericárdio é um músculo!
3 – existem meridianos e órgãos em medicina chinesa que não correspondem a nenhum órgão ou víscera anatómicos como seja o caso do triplo Aquecedor.
Ou seja, não podemos confundir sistematicamente o significado de órgão em medicina chinesa e medicina ocidental e muito menos entrar em confusões sobre órgãos e meridianos.
Um piercing na orelha afeta o órgão correspondente do microsistema
Não. A estrutura descrita na auriculopuntura parece ter sido extraída de muita criatividade e pouca clinica.
Por outro lado se isto fosse verdade pessoas com imensos piercings deveriam evidenciar uma série de efeitos anômalos.
Factos importantes para esclarecer estes mitos da acupuntura:
1 – as provas em que assentam estes mitos da acupuntura são anedóticas.
2 – existem milhões de pessoas com piercing e brincos sem nenhum tipo de alteração.
3 – existem uma série de modelos diferentes de auriculo com diferenças na localização dos mesmos pontos e todos funcionam muito bem… supostamente!
4 – se a acupuntura auricular funcionar tudo indica que esteja relacionado com a inervação da mesma e não com um qualquer microsistema baseado em wishfull thinking.
Preciso fazer Chi Kung para ser um bom acupuntor
O chi kung está para a acupuntura tradicional chinesa como o boxe para a medicina dentária ou o ping pong para a matemática aplicada!
Gosta de fazer chi kung? Faça. Mas isso não vai influenciar em nada a sua capacidade para se tornar um(a) bom(a) acupunturista.
Na realidade, o chi kung costuma estar associado a crenças esotéricas e muito provavelmente isso só vai atrapalhar a sua capacidade de obter maior objetividade clinica.
O prestígio do chi kung no Ocidente deve-se unicamente ao excesso de pensamento esotérico proveniente dos acupuntores new age.
Alguns factos relevantes para eliminar estes mitos da acupuntura:
1 – o chi kung é obrigatório na maioria das escolas de acupuntura no Ocidente mas não faz parte do curriculo das universidades chinesas.
2 – o chi kung é amplamente praticado na China. Como é o futebol ou o ping pong ou o kung fu. Isso não faz dessas modalidades áreas de saúde a serem ensinadas em cursos de medicina chinesa.
3 – para ser um bom acupunturista precisa saber: anatomia, topografia meridianos e pontos, neurofisiologia, manipular agulhas, raciocínio clinico.
É preciso sentir a energia dos pontos de acupunctura
É capaz de ser uma das maiores inutilidades numa consulta de acupuntura.
Os pontos de acupuntura regulares e extra tem definições anatómicas precisas, logo é mais importante estudar anatomia do que sentir qualquer energia que deseja sentir.
Sentir os pontos sem conhecer anatomia e topografia é perda de tempo e se souber anatomia e topografia não vai precisar sentir nenhum ponto…
Já reparou que só sente os pontos de acupuntura que a sua escola lhe ensinou?
E que escolas diferentes “sentem” algumas variações na localização de pontos?
O terapeuta deve fazer chi kung para eliminar as “energias perversas”
Gostaria de deixar uma coisa clara: se gosta de fazer chi kung faça.
Inegavelmente é bom para a saúde, vai ajudar a aumentar a concentração e de certeza que vai diminuir os stresse.
Mas o chi kung é tão importante numa consulta de acupuntura como pólo aquático para engenharia aero-espacial e de certeza que você não perde imenso tempo a jogar futebol para ser médico.
Em suma o chi kung para eliminar as “energias negativas” do paciente está ao nível dos tratamentos que os meus sobrinhos de 4 anos me fazem.
Infelizmente, é um dos mitos da acupuntura mais defendido pelos acupuntores.
Se se quer proteger em vez de eliminar “energias” procure usar técnicas de assepsia clínica.
Uma vez assisti um profissional a retirar a agulha de acupuntura, pressionar o local com o dedo nu e no final sair da consulta e começar a praticar chi kung para eliminar as energias negativas.
Inesperadamente não tinha qualquer interesse em aprender técnicas de assepsia.
A fitoterapia não se incompatibiliza com medicação
Algumas escolas ensinam que a fitoterapia atua a nível energético enquanto a medicina ocidental a nível químico e, como tal, as duas não interagem.
Os alunos tranformam-se em profissionais e depois propagam este tipo de mitos da acupuntura e medicina chinesa que acabam por ser perigosos para os seus doentes.
Factos relevantes para terminar com estes mitos da acupuntura:
1 – pensamento energético nada tem a ver com acupuntura. Isso é linguagem de Harry Potter.
2 – as plantas de fitoterapia tem princípios ativos. Esses princípios ativos interagem com princípios ativos de medicamentos.
3 – interações farmacológicas são factos científicos comprovados, explicados e demonstrados.
Mitos da acupuntura tradicional para nerds
9BP e 34VB tem energias opostas e não podem ser usados simultaneamente
Este mito foi muito badalado durante uns anos. Ele é uma consequência da ignorância linguistica dos acupuntores ocidentais.
Estes pontos encontram-se opostos na perna. O 9BP por baixo da pata de ganso e o 34VB por baixo do bordo antero-inferior da cabeça do perónio.
O nome do 34VB é Yang Ling Chuan e o 9BP chama-se Yin Ling Chuan. Como os terapeutas ocidentais gostam de imaginar que o yin-yang representam energias opostas, e face à oposição anatómica de cada um deles criou-se o mito que não podem ser usados simultaneamente.
Não usar pontos do meridiano do Coração… ou usar só em sedação
Há uns anos, no Facebook, alguém escreveu esta pérola:
“O que vcs acham do pensamento de algumas escolas em evitar, ou de não utilizar o meridiano, ou pontos do Coração?”
Se isto não fosse suficiente mau, ainda houve quem comentasse:
“Como é o Canal mais yin e que é a onde a Energia Terra ascende aos Céus, temos que mantê-lo harmonizado. Att”
“E igual ao uso do VC 17 minha escola só ensinou a usá-lo em posição de sedação. Por causa da janela do céu. Acredito que no caso do meridiano do coração e só ter cautela na escolha desses pontos para nao sobrecarregar o aumento de circulação de energia. Ter mais precaução com pessoas cardíacas, hipertensões, pois aumenta o fluxo sanguíneo.”
Infelizmente, este é o nível de conhecimentos de muitos terapeutas ocidentais.
Ao estudar, obras técnicas bilingues, das Universidades Chinesas, não encontramos uma única proibição de usar estes pontos ou de somente usá-los em sedação. Pelo contrário.
Possivelmente, este mito está associado a um evento histórico: segundo consta, durante alguns períodos na história da China, era proibido usar pontos deste vaso, porque o Coração representava o imperador (imperador dos órgãos).
No máximo 10 pontos de acupuntura
Dos muitos mitos da acupuntura este é aquela que me chamava mais a atenção enquanto professor de acupuntura clinica.
Este mito defende que num tratamento de acupuntura não se podem usar mais de 10 pontos.
Podem usar 9 pontos de acupuntura, podem usar 8 pontos de acupuntura podem ser usados, mas 11 pontos de acupuntura? Isso é quase sacrilégio.
Eu adorava que me mostrassem um livro técnico de medicina chinesa (especialmente edições bilingues das universidades chinesas) que defendesse tal coisa.
É que me parece que os chineses nunca aprenderam verdades absolutas da acupuntura tão fabulosas.
Além de nunca expressarem publicamente essa preocupação parece inclusivamente terem algum apreço em opor-se à mesma.
Permitam-me alguns exemplos ousados retirados das melhores universidades chinesas:
A obra Acupuncture & Moxibustion publicada pela universidade de Medicina Tradicional Chinesa de Beijing no tratamento de AVC aconselha o seguinte protocolo:
26VG, 12 JING-WELL DA MÃO (9C, 9MC, 11P, 1TA, 1IG, 1ID), 8MC, 40E, 20VG, 3F, 1R
Ao todo são 12 pontos de acupuntura que falamos. Isto deve ser um novo record, mas a coisa ainda é pior do que parece.
É que estes são somente os pontos principais, porque depois ainda são aconselhados pontos secundários que devem ser adicionados consoante a presença de sintomas específicos.
Para os dois sintomas mencionados na obra são adicionados mais 6 pontos, ou seja o protocolo pode chegar a ter 18 pontos. Quase o dobro do permitido por lei em algumas escolas de acupuntura portuguesas.
E o AVC não é o único exemplo uma vez que no tratamento da dor o número de pontos ashi associados a outros pontos pode facilmente ultrapassar os 10 pontos.
Infelizmente a elite de especialistas de acupuntura da universidade de nanjing também parece não fazer ideia de conhecimento tão recente (na realidade é tão recente que ainda não deve ter passado as fronteiras nacionais).
Por exemplo, na edição bilingue Chinese Acupuncture and Moxibustion, aconselham o seguinte protocolo para tratar asma por vazio de yang do coração e rim:
13B, DINGCHUAN, 22VC, 1P, 17VC, 6P, 15B, 23B, 6VC, 4VC, 6MC
Sem dúvida que a maioria dos protocolos apresentados nas obras referidas tem número de pontos igual ou inferior a 10.
Mas isso somente porque não era necessário mais do que esses pontos e não devido a uma qualquer lei que impõe o teto máximo de 10 pontos.
Limite de pontos para protocolos de acupuntura
Um protocolo de acupuntura não tem um limite objetivo de pontos uma vez que diferentes problemas podem precisar de mais ou menos pontos.
Usei o exemplo do AVC por ser o mais óbvio. Efetivamente o tratamento do AVC, e muito particularmente, as suas sequelas é um tratamento que facilmente ultrapassa os 10 pontos de acupuntura.
Sabendo que um protocolo é sempre definido pelos seus princípios terapêuticos o que é importante é garantir que qualquer acupuntor consegue compreender os princípios terapêuticos que deram origem a um determinado protocolo.
Não interessa se o protocolo tem 7 pontos ou tem 12, pois muitas vezes isso depende mais do acupuntor que outra coisa.
Não existe um limite fixo de pontos, mas obviamente que dificilmente teremos um bom protocolo com 30 pontos.
Provavelmente até será eficaz, mas um protocolo com 30 pontos (especialmente os mais importantes) é uma espécie de antibiótico de largo espectro.
Trata de tudo um pouco, mas dificilmente se perceberão os princípios terapêuticos que lhe deram origem.
E sim, existem correntes de pensamento na MTC que defendem o tratamento de doenças com um único ponto de acupuntura e existem outras correntes a usarem 30 pontos. E os ocidentais adoram essas excentricidades.
Mas não se observa a elite das universidades chinesas a fazerem esses malabarismos. Não se definiu a combinação de pontos para depois se mandar fora numa espécie de freak show da acupuntura.
A origem da proibição
Claramente que quem ensina este tipo de coisas não o foi buscar a livros técnicos de medicina chinesa.
Não só estes mitos da acupuntura não aparecem em lado nenhum como, neste caso, são ignorados em muitos protocolos que se podem estudar nas edições bilingues das universidades chinesas.
As pessoas que defendem isto, ensinam ou foram ensinadas, em escolas ligadas a clinicas com hábito de vender as agulhas aos pacientes.
É o velho esquema de vender agulhas aos pacientes para proteção dos mesmos e que eu já denunciei em artigos bem mais antigos.
Mas este esquema está adaptado para enganar alunos e levá-los a seguir a mesma prática – ou pelo menos evitar explicar-lhes de onde é que vem esta regra.
Como uma caixa de agulhas tem 100 agulhas e, na altura de venda ao paciente, é referido que cada caixa dá para 5 tratamentos ficamos com a utilização máxima de 20 agulhas por consulta de acupuntura.
Uma vez que na generalidade a aplicação da acupuntura é bilateral 20 agulhas significa usarem-se 10 pontos de acupuntura.
E assim surge a proibição de se usarem mais de 10 pontos de acupuntura por tratamento.
Uma comodidade que beneficia clinicas que fazem rendimento da venda de agulhas.
É bonito saber que o interesse económico de alguns condiciona a aprendizagem de tantos.
Protocolos de acupuntura pequenos para tonificar e protocolos grandes para dispersar
Entre os mitos da acupuntura tradicional chinesa este é aquele que se encontra mais generalizado nos acupuntores ocidentais.
O problema em não saber colocar em causa aquilo que aprendemos é que se acaba por aceitar tudo o que nos é dito como verdades.
Esta verdade absoluta, e que alguns gurus de muitas escolas de pensamento, adoram propagar consiste em definir o tamanho do protocolo de acordo com o desejo de se tonificar ou dispersar. Ou seja tratar padrões de plenitude ou de vazio.
O conceito de tonificar diz respeito a um determinado conjunto de ações capazes de fortalecer o individuo na presença de determinados sintomas.
Sintomas esses classificados em padrões de deficiência (vazio de qi, vazio de yin, etc…).
Obviamente que dispersar diz respeito a um determinado conjunto de ações com o objetivo de tratar sintomas classificados em padrões de plenitude.
Os chineses também não aprenderam estes mitos da acupuntura
Tal como muitos mitos da acupuntura no ocidente, os chineses parecem ter-lhes passado completamente ao lado.
Da mesma forma que nunca aprenderam que no máximo só poderiam usar 10 pontos de acupuntura também nunca aprenderam que só podiam usar protocolos de acupuntura pequenos para tonificar e grandes para dispersar.
Mais uma vez me irei refugiar em exemplos retirados das elites das melhores universidades chinesas.
De acordo com a universidades de Beijing, no tratamento de dor epigástrica por agressão ao estômago proveniente da estagnação de qi do fígado podemos usar o seguinte protocolo:
6MC, 14F, 3F, 12VC, 36E
Parece um pouco pequeno para um protocolo que se pretende dispersar. Afinal de contas falamos de um padrão de plenitude.
No padrão clínico seguinte, um vazio de qi com estase por frio usa-se 6 pontos:
12VC, 6VC, 20B, 6MC, 4BP, 36E
Nada mau. Para um protocolo de plenitude usam-se 5 pontos e para um protocolo de vazio de plenitude usam-se 6 pontos. Mas afinal de contas não deveriam ter diminuído?
Alguns leitores poderão contestar o que escrevi uma vez que falamos de um protocolo associado para vazio e plenitude. Ok. Vamos continuar com exemplos.
A mesma equipa de especialistas para o vómito referem o protocolo geral:
12VC, 6MC, 36E, 1R
De seguida aconselham:
1 – a adição de 2 pontos para tratar vómitos por invasão de vento externo (plenitude);
2 – aconselham 2 pontos para vómitos por estagnação de alimentos (plenitude);
3 – aconselham a adição de 2 pontos para tratar vómitos por deficiência do baço e do estômago.
Ou seja, o mesmo número de pontos seja para tratar padrões de plenitude ou deficiência.
E o que vale para os vómitos vale para tratamento da obstrução urinária e uma série de outros problemas.
E o que vale para a universidade de Beijing vale para Shangai ou Nanjing.
Os melhores acupuntores dessas universidades parece não terem aprendido verdades tão simples quanto aquelas ensinadas nas escolas de acupuntura de muitos países ocidentais.
Mais uma vez a universidade de Nanjing segue a linha da Universidade de Beijing e não liga nenhuma ao tamanho dos protocolos de acordo com o tipo de padrões.
Usando o mesmo exemplo já referido do tratamento de asma, na obra Chinese Acupuncture and Moxibustion temos como prescrição base:
13B, DIANGCHUAN, 22VC, 1P, 17VC, 6P
Mucosidade-calor: 14VG, 40E
Vazio de qi do Baço e Pulmão: 20B, 43B, 6VC, 36E
Vazio de yin do pulmão e rim: 23B, 4VC, 3R, 6BP
Vazio de yang do coração e rim: 15B, 23B, 6VC, 4VC, 6MC
Ou seja, todos os protocolos para deficiência (os 3 últimos apresentados) possuem um maior número de pontos de acupuntura em comparação com a prescrição para tratar o padrão de plenitude (mucosidade-calor).
Exatamente o contrário dos mitos da acupuntura vendidos nas escolas portuguesas.
A origem do problema
A medicina chinesa tem uma componente clinica que se encontra sujeita a uma leitura filosófica.
O problema em definir objetivamente o valor dos tratamentos em medicina chinesa consiste exatamente em saber fazer a diferenciação entre filosofia e empirismo clínico.
Os aperfeiçoamentos a que se elevam as técnicas de manipulação de agulhas são um exemplo claro da filosofia a sobrepor-se ao aspeto clinico.
Rodar 3 vezes para a direita ou para a esquerda vai ter mesmo um efeito de tonificação ou sedação da agulha?
Será mesmo necessário inserir em primeiro lugar 0 3ID e só depois o 62B para abrir determinado meridiano maravilhoso?
Quando não sabemos separar a filosofia da clinica acabamos por definir mitos da acupuntura que aos olhos do senso comum parecem um pouco idiotas.
Se queremos ter uma noção aproximada da fronteira existente entre filosofia e clinica na medicina chinesa temos de nos afastar da mesma e olhar para a sua generalidade e nunca focar atenção nos pormenores.
Perder o enquadramento geral da MTC leva muitas vezes a ideais e verdades absolutas muito pessoais.
Os mitos da acupuntura, neste caso, não são mais do que o reflexo da ignorância disfarçada de conhecimento tem na comunidade de acupunctures ocidentais.
Um total desfasamento dos conhecimentos técnicos, um afastamento da objetividade clinica e o estabelecimento de verdades absolutas da acupuntura com base num supostos prestígio social de poucos e total ausência de auto-crítica de muitos.